Uma das
mais tormentosas questões para quem escreve em português é o uso correto do
hífen. Este sinal gráfico (-), a que também se chama traço de união, é usado
para pacificar os elementos de um composto, para que não vão a vias de fato. É
utilizado para servir de conciliador a alguns prefixos e os demais elementos de
uma palavra composta, prevenindo-se conflitos e mortes gramaticais, e é
aplicado para separar as sílabas em final de linha, ou, ainda, para indicar os
elos enclíticos e mesoclíticos.
Das
hipóteses acima algumas são rigorosamente indolores e de facílima aplicação.
Nem se necessita de anestesia. No entanto, quem quer que escreva precisa de
arriscar-se a comer da árvore do conhecimento do bem e do mal. Refiro às
palavras bem e mal e não exatamente à transgressão adâmica noticiada no
Pentateuco. De fato, as palavras bem e mal têm temperamento irascível e exigem
espaço exclusivo. São indomáveis. Para praticar o bem, deve verificar se se
trata de palavra composta por aglutinação, caso em que não haverá hífen
[benquisto, benfeitor]. Não sendo assim, convém recolher da árvore do
conhecimento do bem e do mal alguns hífenes a serem usados em bem-estar,
bem-vindo, bem-aventurança etc. E, para não parecer pessoa malcriada ou
mal-educada, ou alguém que queira malferir o idioma, será bom saber que, após
praticar o mal, usa-se o hífen em palavras começadas por vogal, h ou l, como
nos exemplos “mal-humorado” e “mal-limpo” [VOLP da ABL].
Em
“Deixem o hífen em paz”, trabalho disponível na internet
[http://goo.gl/6lJHde], Wertheimer e Scarton lembram-nos didaticamente do que
alguns dizem sobre o hífen: “foi nosso arquiinimigo, e continua sendo nosso
arqui-inimigo” [sic].
Sem fugir
ao tema, falemos de flores. Ah, as flores… Gosto delas. Outro dia, fui comprar
umas e meti-me em apuro. Vi uns malmequeres lindos e pedi à vendedora duas
dúzias deles. A florista, uma mui jovem senhora de uns oitenta anos de idade,
não percebeu plenamente o que eu lhe pedira, e perguntou-me: “quer malmequeres
ou bem-me-queres?”. Falava sério e tinha lá as suas razões. Para não criar
desentendimentos com os defensores do Acordo Ortográfico de 1990, nem com os
seus respectivos opositores, ela organizara na sua loja duas alas de
prateleiras. Numa delas estavam todas as flores com os nomes anteriores ao
Acordo Ortográfico, e que assim se mantiveram após a sua vigência; na outra, as
de nomes alterados pelo Acordo. Respondi-lhe: “senhora, venda-me os mais
baratos”, contudo, uns e outros tinham o mesmo preço. Eram iguais. Comprei-os e
entrei numa livraria para adquirir logo uma gramática da língua portuguesa.
Antes de
reformar-me, trabalhava na função pública e servia a um dos ramos da Justiça
Federal. Lá, degustei sem sal e sem tempero muitos batráquios anuros vivos. Um
dia, engoli um desagradável e irrequieto sapinho. Na qualidade de secretário de
audiência, função que exercia ao tempo do episódio, deveria exarar em ata tudo
o que me ditava o/a juiz/a. Assim, ao ouvir o que o/a magistrado/a dissera, eu digitei
“supracitado”. Na altura, ele/ela exigiu-me enfaticamente intercalar um hífen a
supra e a citado, para, enfim, chegar vitoriosamente ao “supra-citado”. Tudo
isto audível e publicamente, claro. Sentindo-me qual verdadeiro iletrado,
cumpri silente e fielmente o seu divinal e judicial mandado.
Com
efeito, o Acordo Ortográfico andou a modificar as coisas. Mas, no caso do termo
supracitado, em nada o afetou. A dúvida que tenho – e nem a poderia extirpar
via embargos declaratórios, porque precluído o prazo processual – é se aquele/a
magistrado/a já terá aprendido a escrever supracitado. Tê-lo-á? Insondável
mistério!
Senhoras
e senhores, façam as suas apostas. Dou-lhes uma…
Posted on 5 de Dezembro de 2016
Fonte: Verdade na Prática
Magno R
Andrade
@magnoreisand – siga-me no Twitter
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Magno Reis Andrade, protestante, brasileiro, nasceu em 17 de Junho de 1951, em Jequié, BA. Aos oito anos de idade, foi com os seus pais morar na capital baiana. Em 1969, foi admitido na Universidade Federal da Bahia, para, em 1973, bacharelar-se em Farmácia-Bioquímica. Com tal competência laborou até o ano de 1980, principalmente no Município de Bom Jesus da Lapa, BA. Lá, conheceu a sua futura esposa, a mesma que lhe daria as suas duas preciosas filhas. Em 1980, aceitou o desafio de trabalhar numa função pública municipal em Salvador, BA. Neste mesmo ano, ingressou no curso de Administração de Empresas, mantido pela Universidade Católica do Salvador, instituição que, em 1986, conferiu-lhe o respectivo grau de bacharel. Ainda em 1980, voltou à Universidade Federal da Bahia, para realizar o curso de Administração Pública, enfim, inconcluso por exiguidade de tempo. Mediante concurso público, em 1989 passou a exercer o cargo efetivo de Analista Judiciário no Tribunal Regional do Trabalho da Quinta Região, BA. Ao se reformar em Novembro de 2010, exercia há sete anos as funções de assessor jurídico no Serviço de Análise de Processos Judiciais, unidade organizacional de direto apoio à Presidência do Tribunal trabalhista. Em 1990, retornou à Universidade Católica do Salvador, desta feita para, em 1995, obter o grau de bacharel em Direito. Entre os anos de 1970 e 1973, integrou profissionalmente o Madrigal da Universidade Federal da Bahia. Gosta de idiomas, ama a língua portuguesa.
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